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Agência de Notícias

A saúde humana em Caxiuanã

Professor da UFPA mostra a importância da Estação Científica Ferreira Penna para a pesquisa de campo e a saúde das populações ribeirinhas que vivem dentro e no entorno da floresta.
publicado: 16/12/2013 09h30, última modificação: 22/08/2017 15h43

Agência Museu Goeldi - A Floresta Nacional de Caxiuanã (Flona) é região que representa de forma significativa a flora e fauna da Amazônia, mas também é terra de gente. Complexas pesquisas de estudos de insetos, répteis e mosquitos foram realizadas para coletar características do comportamento dos grupos que vivem nessa Unidade de Conservação (UC) localizada entre os municípios de Portel e de Melgaço, no Pará. Mas a Estação Científica Ferreira Penna (ECFPn), mantida pelo Museu Paraense Emilio Goeldi (MPEG) na Flona, serviu de base para o desenvolvimento de pesquisa relacionada à qualidade de vida da gente que vive na floresta.

“Considero a Estação Científica Ferreira Penna (ECFPn) uma área de pesquisa de campo com a melhor infraestrutura nas Américas”. Com essa afirmação, o médico e bioantropólogo 

Hilton P. Silva, professor do Programa de Pós-Graduação em Antropologia da Universidade Federal do Pará (UFPA) destaca a importância de uma base de pesquisas em uma das principais áreas de conservação da Amazônia Brasileira.

Segundo Hilton Silva, a área conhecida como a Flona de Caxiuanã era ocupada populações indígenas no passado. As populações ribeirinhas, originadas da mistura dos europeus, índios e escravos africanos, hoje, moradoras das proximidades da Estação Científica Ferreira Penna e dos municípios de Portel e Melgaço são o público das suas pesquisas. O desconhecimento sobre as populações da floresta foi o que levou Hilton a desenvolver a pesquisa. “Na Amazônia, apesar da grande área ainda ser preservada (85%), a quantidade de informações disponíveis sobre a biodiversidade e sobre as populações rurais ainda é muito limitada”, destaca o professor.

Ao redor da Estação existem três comunidades: o Laranjal, a Pedreira e Caxiuanã com mais de 190 habitantes e com estrutura populacional que indica alto índice de jovens. Hilton Silva, responsável por uma investigação dos aspectos sociais, ecológicos, do estilo de vida e saúde dos residentes nas áreas de influência da Flona de Caxiuanã, coletou diversos dados que mostraram como vivem esse contingente populacional, qual a situação fundiária, e em que tipos de moradia e condições sanitárias.

Saúde na floresta - Hilton Silva, que é professor da Universidade Federal do Pará (UFPA), do Programa de Pós-Graduação em Antropologia (PPGA) do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH), coordena um projeto desde 1997 sobre a saúde, o crescimento e a evolução de doenças em populações ribeirinhas, que entre outros, envolve os grupos de Caxiuanã. Para o professor, a riqueza de Caxiuanã é incontestável.

Atualmente, Hilton desenvolve projetos de análise do crescimento populacional e da saúde das populações da Flona Caxiuanã e entorno que já resultaram em diversas publicações e agora orienta a aluna de doutorado Lígia Filgueiras, do Programa de Pós-Graduação em Antropologia da UFPA.

Vivendo na floresta - Os domicílios têm, em média, dois cômodos, não há eletricidade a não ser por umas poucas casas que dispõem de painéis solares adquiridos através de um projeto do Museu Paraense Emílio Goeldi, e todos os domicílios são de madeira, palha, estuque ou uma combinação desses materiais, e cobertos de palha ou telhas de barro”, descreve Hilton Silva, que é professor da Universidade Federal do Pará (UFPA), em trabalho de investigação entre a interação dos seres humanos e o meio ambiente da Amazônia.

Em sua avaliação, a qualidade das moradias, o reduzido número de espaços privados e a concentração populacional nas casas agem como catalisadores de doenças contagiosas. “Conjuntivites, escabiose, pediculose, dermatoses, gripes e outras doenças respiratórias agudas, e tuberculose, tendo sido afecções registradas durante as pesquisas de campo”, destaca Hilton.

As condições sanitárias também são consideradas precárias pelo professor. Apenas 7,1% das casas têm sanitários, que são externos, de madeira ou palha, e sobre buracos escavados no chão, onde os dejetos são depositados sem tratamento. “A totalidade das famílias da Flona usa água diretamente dos rios e igarapés, locais para todos os usos diários. Ninguém usa qualquer tipo de tratamento para a água consumida, e todo o lixo é queimado nos quintais, ou lançado nos rios”, relata Hilton.

Para o professor, essa situação favorece o desenvolvimento de doenças infecciosas e parasitárias transmitidas pela água como diarréias de diversas origens, amebíase, giardíase, cólera, hepatite, etc. “Apesar de casos de cólera não terem ocorrido na região durante o trabalho de campo, foram registrados hepatite e grande incidência de parasitoses intestinais na população estudada”.

Os dados foram obtidos em levantamentos realizados para sua tese entre 2003 e 2005 em projetos voltados para a saúde e as interações entre os seres humanos e o meio ambiente da Amazônia. A investigação apontou os tipos e os padrões de moradia, as condições sanitárias, o número de pessoas por domicílio seus graus de parentesco, situação educacional, ocupações, situação fundiária, tipos de cultivos mais freqüentes, insumos utilizados, renda doméstica, tipos de uso do solo e condições ambientais da propriedade.

Hilton destaca em artigo publicado em 2006 que são aproximadamente 206 pessoas que, à época, viviam nessas comunidades, divididas em 35 famílias e 28 domicílios. Os moradores da Flona são “posseiros”. Nenhum deles tem título de propriedade oficial da terra, embora os moradores considerem que têm direitos adquiridos pelo tempo de uso das áreas ocupadas, situação freqüentemente questionada pelo então Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e de Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), responsáveis pelas unidades de conservação brasileira, que passou a jurisdição para o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio).

Complexidade da vida e da saúde ribeirinhas - Não só as condições ambientais e de saúde e saneamento foram investigadas. Hilton Silva estudou aspectos referentes ao crescimento físico e nutricional infantil que estavam diretamente ligados às atividades econômicas. Os moradores da Flona cultivam mandioca, feijão, tabaco, milho e frutas. “Subsistem principalmente da agricultura familiar, caça e coleta”, que não usa fertilizantes industriais ou pesticidas, informa o professor.

A população fez da mandioca (Manihot esculenta) o mais importante produto: elemento básico para a alimentação local, a mandioca é responsável pela fabricação da farinha, muito consumida ao lado do açaí (Euterpe oleracea), principal produto do extrativismo local.

Dentre outros produtos, estão a castanha-do-pará (Bertholletia excelsa), o palmito, a madeira e pedras da baía de Caxiuanã. “As atividades agrícolas podem ser sazonais, como a coleta de açaí (feita de julho a dezembro)”, mas também ocorrem ao longo do ano, como é o caso da extração de palmito. “Nas comunidades de Laranjal e Pedreira, a caça e a pesca também são praticadas durante o ano todo, enquanto, na comunidade de Caxiuanã, ficam mais intensas no verão”, ressalta Hilton.

Para o pesquisador “estudos sobre a saúde humana são fundamentais para garantir a proteção ambiental, pois somente pessoas saudáveis podem promover uma relação saudável com o ambiente natural”.

Texto: Silvia de Souza Leão

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