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Agência de Notícias

Árvores amazônicas: hiperdominância de poucas espécies

Duas espécies de açaí, uma de breu e o matamatá-branco estão no restrito grupo de árvores que dominam a bacia amazônica
publicado: 18/10/2013 15h30, última modificação: 15/06/2018 10h26

Agência Museu Goeldi – Liderados pelo biólogo holandês Hans ter Steege,  Rafael Salomão e Ima Vieira, (pesquisadores da Coordenação de Botânica do Museu Paraense Emílio Goeldi) e outros 117 pesquisadores vinculados a Amazon Tree Diversity Network - ATDN (Rede de Diversidade de Árvores da Amazônia), publicaram ontem um artigo na Science, sobre as árvores hiperdominantes da Amazônia. Para os autores, que acumulam décadas de estudos na Floresta Amazônica, a região ainda permanece um enigma em vários sentidos. Até recentemente, os cientistas ainda não sabiam quantas árvores, quantas espécies e quais os territórios que elas se concentram na Amazônia.  O artigo “Hyperdominance in the Amazonian Tree Flora” tenta responder a estas e outras questões.

O estudo estimou que o número de árvores existentes nos 6 milhões de quilômetros quadrados da Amazônia é de 390 bilhões – o levantamento relaciona apenas exemplares com diâmetro mínimo do tronco (DAP) de 10 cm. A média de árvores por hectare é de 565. A maior surpresa foi o dado de que apenas

 227 das 16.000 espécies de árvores são hiperdominantes, e contribuem com mais da metade dos 390 bilhões de indivíduos.

As espécies consideradas hiperdominantes correspondem a apenas 1,4% do total das espécies estimadas para a Amazônia. Um dado de suma importância, pois mais da metade dos frutos, flores, folhas e biomassa da maior floresta do mundo, rica em biodiversidade, são de uma pequena parcela das espécies, que tem uma larga representatividade nos ciclos de carbono, água e nutrientes. Mas, um alerta é necessário - não é possível menosprezar a importância da contribuição das mais de 5.000 espécies de árvores raras no funcionamento dos ecossistemas.

Campeões - O açaí-do-amazonas (Euterpe precatoria), também conhecido como açaí-solitário por apresentar apenas um estipe, é a espécie com maior população (5,21 bilhões de estipes) entre todas as hiperdominantes. O açaí que ocorre em touceiras, o Euterpe oleracea, ocupa a sexta posição com 3,78 bilhões de indivíduos. Outras quatro espécies de palmeiras estão entre as 20 de maior hiperdominância. A Protium altissimum, uma espécie de breu, é a mais populosa, com 5,21 bilhões de árvores, seguida de Eschweilera coriacea, o matamatá-branco, com 5 bilhões de árvores. Detalhe: o matamatá-branco é a única hiperdominante em todas as seis regiões adotadas pelo estudo.

Segundo o botânico Rafael Salomão, que contribuiu com dados provenientes de mais de 100 lotes inventariados, o sucesso das hiperdominantes pode ser explicado por duas hipóteses. “Prevê-se a descoberta de que essas árvores sejam desproporcionalmente resistentes a patógenos, herbívoros especializados e outras fontes de mortalidade que dependam da frequência. Cultivos humanos muito difundidos na fase pré-Colombiana pode ser outra hipótese convincente para explicar o hiper domínio”, diz Salomão.

Metodologia –O estudo feito por toda a Amazônia, que foi divida em seis grandes regiões, totalizou 1.170 parcelas de 1 ha cada, incluindo os cinco tipos de vegetação: terra firme, várzea, igapó, pântanos e floresta de areia branca.

A pesquisa abordou principalmente a abundância (nº de indivíduos por área), a frequência (distribuição espacial), a raridade e a riqueza da flora arbórea de toda a Amazônia (nove países). As populações das espécies foram distribuídas em classes de dominância - RAD (rank-abundance distribution) -, sendo classificadas em hiperdominantes (227 espécies), dominantes (4.773), raras (5.000) e muito raras (6.000 espécies), totalizando estimadas 16.000 espécies amazônicas.

Impactos –Para Ima Vieira, ecóloga do Museu Goeldi e coordenadora do INCT Biodiversidade e Uso da Terra na Amazônia, este tipo de estudo mostra a força da cooperação intelectual no qual cientistas de vários países e instituições contribuem para o avanço do conhecimento sobre a Amazônia. “Isso só foi possível graças ao trabalho continuado de vários anos de pesquisa de todos os envolvidos que assinam o artigo. Este é um exemplo que deve ser seguido na política de ciência nacional, no apoio a projetos de longo prazo e interinstitucional”, ressalva Vieira.

O estudo da Rede ADTN deve apontar novos rumos para simplificar as pesquisas bioquímicas, de ecologia animal e vegetal, além do mapeamento das plantas na Amazônia, o que poderá contribuir de maneira eficiente aos objetivos da Conservação e da Restauração de passivos ambientais na região.

A edição de outubro da revista Science estará disponível a partir de hoje, 18 de outubro, acesse: http://www.sciencemag.org/content/342/6156/1243092.abstract?rss=1

Texto: Fernando Cabezas